terça-feira, 25 de agosto de 2015

TRAGTENBERG, Maurício. Educação e burocracia. São Paulo: Unesp, 2012.

TRAGTENBERG, Maurício. Educação e burocracia. São Paulo: Unesp, 2012.
«A ampliação da escolarização formal não "salvou" o país, nem se constitui em elemento para a formação de mão-de-obra qualificada. Em outros termos, quanto menos a escola tem esse papel tanto mais ela se realiza como aparelho ideológico, inculcando valores e o comportamento das classes dominantes nas classes dominadas» (TRAGTENBERG, 2012, p.16).
Os educandos «aprendem em ritmos diferentes, em função de sua origem social, do capital cultural que possuem. […] O desconhecimento da realidade socioeconômica concreta não pode ser suprido por nenhuma tecnologia educacional, por mais sofisticada que seja. Ela tem endereço certo: converter o sistema de ensino no grande mercado das quinquilharias audiovisuais, fabricadas pelas multinacionais e impingidas aos pobres como a última palavra do "progresso" e da "modernização"» (TRAGTENBERG, 2012, p.17-19-20).
«O sistema de ensino se realiza através da distribuição diferencial do saber, possibilitando meios para o exercício diferencial do poder, que, por sua vez, reproduz diferencialmente a lógica das classes existentes. Dessa maneira os denominados processos de inovação pedagógica nada mais são do que inovações tuteladas pelo Estado, que orientam ideologicamente os métodos de segregação escolar. Assim, quem quiser manter tudo como está realiza uma reforma educacional e as coisas ficarão como sempre estavam, porém, com nova roupagem retórica» (TRAGTENBERG, 2012, p. 18).
“O grupo de origem proletária ou camponesa tem incorporado ao seu capital cultural elementos de caráter mágico-religioso, cultura de senso comum ou o que antropólogos da pobreza chamam de visão fatalista do universo” (TRAGTENBERG, 2012, p. 18-19).
A universidade sofre um processo de "domesticação", na medida em que a sua atuação ocorre no âmbito da ação dos especialistas, restrita à sua prática pedagógica, sem conexões com a sociedade global, pelo menos explícitas, transigindo com os mecanismos "externos" de exclusão e capacitando os seus diplomados a preencherem as funções de inculcação/repressão que garantam a hegemonia da facção dominante (2012, p. 24-25).
A universidade só será de pesquisa quando definir a cultura que vai ensinar (2012,  p. 25).
A reforma universitária de 1968 nada mais significou do que uma inovação tutelada pelo Estado […] Quem é neutro em política reproduz a política do poder. […] Produz e reproduz conhecimentos "legítimos" ao mesmo tempo que confere, através do título, poder simbólico a quem já tem poder real (TRAGTENBERG, 2012, p. 26).
Dessa maneira, a escola média, num período de "lactescência" do adolescente, em vias de dirigir-se ao mercado de trabalho, constitui-se em instituição apenas "disciplinadora", que ensina as regras de obediência e respeito à hierarquia a que se sujeita nas empresas privadas burocráticas e hierarquizadas (TRAGTENBERG, 2012, p. 28).
Educação, acima de tudo, deve ser vista como um bem público e não como mercadoria vendida no mercado dos títulos acadêmico (TRAGTENBERG, 2012, p. 32).
A democracia política é insuficiente sem a democratização das instituições. […] Quanto menos os corpos docentes e discentes participam das decisões na universidade, mais o estamento burocrático ocupa lugar (TRAGTENBERG, 2012, p. 32-33)
A universidade no fundo é isto: um meio de que o Estado se vale para distribuir renda para a pequena burguesia (TRAGTENBERG, 2012, p. 38).
Quem educa é a sociedade. A escola ensina e a sociedade educa. […] Não há relação direta entre altos índices de escolarização e o alto índice de consciência social (TRAGTENBERG, 2012, p. 36)
Quanto menor é o grau de ensino mais se é ignorado. Porque tudo é hierárquico. […] Você, então, é qualificado de acordo com a classe social a que serve (TRAGTENBERG, 2012, p. 36).
Num país onde o salário é de escravo, é muito difícil você falar em pedagogia, falar de técnicas de educação, falar da função formativa do professor, do professor como detentor do saber. Não se iludam, não há tanto saber assim a se deter. E isso até o terceiro grau. […] A universidade hoje forma semianalfabetos. (TRAGTENBERG, 2012, p. 37). Observem a proliferação das faculdades por todas as cidadezinhas do Brasil com seus pomposos nomes Faculdade Barão de Mauá, Joaquim Nabuco, Rui Barbosa. São títulos desse tipo que nada mais são do que comércio, mercado de diploma. Hoje, oitenta por cento das universidades brasileiras são particulares. Mas a grande pesquisa brasileira é feita pelos vinte por cento das universidades estaduais e federais. São elas que mantêm a pesquisa no Brasil (TRAGTENBERG, 2012, p. 37)
O problema educacional é só na aparência: na realidade o problema central é socioeconômico-político, ao qual está estreitamente vinculado o aspecto educacional, que possui um nível de autonomia relativa em relação a esse conjunto (TRAGTENBERG, 2012, p. 33)
A rede pública que serve a população pobre é crucificada pela precariedade de recursos e isso é antissocial (TRAGTENBERG, 2012, p. 39).
Oliveira Vianna já dizia que os partidos políticos no Brasil são entidades de direito privado e não de direito público (TRAGTENBERG, 2012, p. 39).
Porque a condição do trabalhador numa empresa é de semiescravidão, uma escravidão moderna (TRAGTENBERG, 2012, p. 39-40)
O poder coopta muito intelectual. […] Eu não vejo uma luz no fim do túnel. Eu só estou vendo o túnel… (TRAGTENBERG, 2012, p. 40)
A Igreja sempre viveu uma ambiguidade. E isso não é só problema da Igreja Católica: é problema da religião judaica, da muçulmana, que têm o poder de legitimar o poder de controlar o povo. É no sentido chinês. E isso leva a Igreja a muitas ambiguidades. Ela, por exemplo, apoiou o golpe de 1964. A Marcha com Deus pela Família e Liberdade foi organizada pela Igreja. E a Liberdade acabou, ficou a Marcha da Família por Deus. Porém, no processo de 1964 a Igreja separou-se do Estado e começou a ter uma atitude crítica. […] Ela oscila muito entre legitimar o poder e desmobilizar o povo, e vice-versa. […] É um pêndulo que oscila muito. Mas me interesso pela importância social e política da Igreja (TRAGTENBERG, 2012, p. 41).
O indivíduo é resultado da história, é através do processo histórico que ele adquire sua singularidade; as necessidades pretensamente "naturais" são resultantes do trabalho social, constituem-se num produto histórico (TRAGTENBERG, 2012, p. 44).
A escola passa a ser a fábrica dos produtores e consumidores. Na medida em que está inserida na totalidade social, a escola procura definir "certo tipo de homem" a ser produzido e reproduzido (TRAGTENBERG, 2012, p. 68).
O que importa para qualquer instituição burocrática (e a universidade o é antes de qualquer coisa) é sua sobrevivência como tal (TRAGTENBERG, 2012, p. 70).
A universidade não é uma instituição neutra como o é a linguagem, é uma instituição dominante, ligada à dominação, que organiza um tipo de "formação" escolar fundado na relação burocrática professor x aluno (TRAGTENBERG, 2012, p. 70-71).
Como usina do saber a instituição universitária tem duas funções: legitimação e formação de mão-de-obra qualificada para a produção (TRAGTENBERG, 2012, p. 74).
A universidade não é só uma instituição controladora de conhecimentos, mas também o espaço onde a repressão pedagógica se institui (TRAGTENBERG, 2012, p. 75).
Dessa forma a escola se constitui num observatório político, um aparelho que permite o conhecimento e controle perpétuo de sua população, através da burocracia escolar, do orientador educacional, do psicólogo educacional, do professor ou até dos próprios alunos (TRAGTENBERG, 2012, p. 79).
Como a religião e o esporte, a educação pode se constituir num instrumento do poder e, nessa medida, o professor é o instrumento da reprodução das desigualdades sociais em nível escolar (TRAGTENBERG, 2012, p. 79).
A educação na sociedade dividida em classes serve para: a) a criação da mão-de-obra disponível que o sistema necessita; b) a inculcação de maneiras de sentir, pensar e agir que traduzem a ideologia da classe dominante como sendo da "sociedade em geral", e de seu interesse privado como sendo de "interesse público". Nesse sentido, jamais poderá ser elemento redutor de desigualdade, ao contrário, tende a petrificá-las ao conferir, através do diploma, poder simbólico a quem já o possui no real (TRAGTENBERG, 2012, p. 93).
A grande característica do sistema escolar brasileiro é a exclusão, e especialmente daqueles que não tem capital econômico, que moram em favelas, portanto, não tem capital cultural, não falam o português tão acadêmico como o indivíduo da classe média. E às vezes nós queremos impor a eles os nossos valores culturais e inclusive até ético-culturais, os da classe média branca (TRAGTENBERG, 2012, p. 109).
A pedagogia burocrática é fundada para isso, porque ela cria aquele elemento submisso que vai ser submisso na empresa privada. Quem sai da escola e vai para a empresa privada, para a empresa pública, que vai ser acostumado a obedecer ordens, e não a se autodirigir. A escola não educa para a autonomia, educa para a submissão (TRAGTENBERG, 2012, p. 111).

Do indivíduo que necessita aprender, ter experiências das coisas, relacionar-se com os outros, passa-se a enfatizar o sistema. Com base nessa premissa, qualquer realização de projeto educativo assume formas autoritárias, em que cada um tem que se encaixar na "máquina devorante". Um universo de alienações é oferecido ao indivíduo (TRAGTENBERG, 2012, p.178).

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